Sobre o tamanho do seu bolso
Categoria(s) comportamento |
por Ana Farias |
Quando eu era adolescente, nossa, eu fui uma dessas adolescentes revoltadíssimas, frustradíssimas e insuportáveis, sabem como? Bom, um pouco de exagero aqui, sempre fui carinhosa com meus pais, mas de vez em sempre era cheia das vontades.
Meus pais se mudaram de um bairro mais popular aqui de Niterói, onde morei dos 4 aos 13, pra um bairro em expansão na região oceânica, extensão de bairros praianos até hoje só de casas e alguns poucos prédios de no máximo 4 andares (como uma tiny mini Barra), cheio de condomínios de luxo. Então mudei de escola, deixei meus amigos de toda a vida pra trás. Algum tempo depois, quando eu já tava enturmada de novo, com novos amigos, meu pai decidiu que eu merecia ter uma "educação melhor", e me colocou numa escola particular. Sétima série. Podem imaginar o horror de sair de uma escola pública pra um lugar cheio de patricetes e mauriçolas. Antes eu usava uniforme e kichute, e tinha um projeto de namoradinho que me olhava e dizia que eu era linda, sem nem ligar pra minha imensa monocelha de taturana. De repente olhava pros lados e só via surfista malhado e loiras oxigenadas com suas lindas roupinhas "de marca". Eu não tinha roupa da moda, não tinha traquejo social, e, bom, resumindo, o bullying corria solto.
Um ano depois, já enturmada no "grupo dos cretinos" (aqueles que não são nem atletas, nem nerds, nem populares, nem músicos, nem bonitos/feios, nem religiosos, nem ativistas, e etc, então pra eles só sobra serem os piadistas), o problema deixou de ser a deprê da big mudança e passou a ser a deprê de não ter dinheiro pra acompanhar meus amigos, que viviam viajando pra casa de praia/serra, saindo todo fim de semana pra jogar boliche (não sei hoje, mas na época era caaarooo), dando festas em casas labirínticas. Calhou de ter uma crise financeira bem nessa época, e a gente ficou muito sem grana. Eu, ao invés de ser uma pessoa melhor e procurar compreender o lado dos meus pais, que se colocaram em, sei lá, vigésimo lugar pra poderem continuar pagando escola boa* e casa bacana, me tornei rebeldinha. E não é por nada não, mas me sinto tão mal com isso que hoje em dia se tem coisa que eu não suporto é adolescente rebeldinho.
Mas pra que essa trip down Memory Lane?
É que por acaso ontem fiquei colocando minha leitura de blogs de moda em dia, e acabei visitando outros tantos que não conhecia, e daí hoje fui fazer umas fotos numa loja de roupas baratex. Enquanto lá estava, me peguei pensando que houve época em que até roupa dessa loja era tipo coisa cara pra mim - não que fosse, necessariamente, mas é que a gente, como família, não era ligada em consumir roupa, a gente tinha o suficiente, sem se preocupar com moda. Isso só passou a ser uma questão na minha vida quando mudei pra tal escola de patricinhas oxigenadas**.
Claro que isso foi há mais de 20 anos (meodeols). Revista, só Capricho. Computador era uma caixona branca muito esquisita que ninguém sabia pra que servia e pouquíssima gente tinha. Então a gente não era inundada de informação de moda a cada pentelhésimo de segundo. Cosmético era outra coisa que não existia, só fui usar rímel na faculdade, e incolor (hahaha)! Agora é tanta infotentação que meo, fosse eu aquela mesma adolescente hoje, coitada da minha mãe. Tudo bem que a culpa é dela, que não me dava uns merecidos cacetes quando eu aloprava, né.
Então assim, vamos falar de hoje, que você chega na banca e tem seis mil revistas falando dos mesmos assuntos, e que quase todo mundo tem computador ou acesso a ele, e blog taí bombando muito a uma aba do Explorer pra quem quiser ler, e o bombardeio de info é frenético.
Blog é vitrine. Vitrine de todo tipo, pessoal, profissional, intelectual, pensem em qualquer pessoa que tem um blog, ela vai necessariamente se encaixar aí. Porque ninguém escreve pra não ser lido, todo mundo escreve pra colocar sua visão sobre determinado assunto pra quem quiser ler. Focando nos ditos blogs "femininos" (beleza, maquiagem, moda, comportamento), essa idéia de vitrine se torna mais clara ainda: é swatch de maquiagem, é comprinha, é look do dia. Essa vitrine, o blog, é uma ferramenta que possibilita conectar pessoas, e como é feita essa conexão, no caso dos blogs de beleza/moda, não é discutindo Proust nem Derrida (a não ser que dê na telha), é falando de opções de compra e de dicas de montação. E nem vou entrar no mérito de que isso seja futilidade, coisa da qual discordo totalmente, mas né, cada um com sua teoria de vida.
Em se tratando de textos que mostrem a experiência da pessoa com determinados produtos, e como a net graças a deus é democrática e qualquer um pode ter um blog, a gente encontra blogueira de tudo que é classe social, de tudo que é tamanho de bolso. Tem a que faz looks lindos só com coisa importada, tem quem mostra o que se pode fazer com nacionais baratinhos, tem a que mistura tudo. E isso vale de maquiagem à moda.
Eu tenho muita coisa fancy em termos de make, mas nadica de nada no armário. Só uma ou outra peça mais carinha, e mesmo assim nada caro demais. Porque por mais cara que seja, a maquiagem de luxo nunca será tão cara quanto uma roupa de luxo. E só a primeira eu posso me permitir, dentro de um certo limite. Roupa não. Então quando eu entro num blog high society, por exemplo, entro como se tivesse vendo um tapete vermelho do Oscar, ou um programa de viagens pra lugares exclusivérrimos, ou lendo aqueles perfis da Vogue: tá longe de mim, da minha realidade, e ponto final. Não vou ficar me desgastando com isso. Dá aquela pontada no coração, claro, e às vezes ouço o som de um violino solitário, mas ver o look carésimo de uma pessoa que pode pagar por ele não me faz entrar na paranóia de TER QUE TER IGUAL pra ser feliz. Nem sinto ganas de sair falando mal da pessoa, porque né, já dizia minha vó, quem desdenha quer comprar - eu quero comprar e super admito, sem problema, minha inveja é sadia, não me deixa mal nem me faz desejar o mal pra ninguém.
Aí vem o ponto central do post, que é uma coisa que eu queria dizer pra todas as cabecinhas jovens que, como eu quando não tinha ruga nem celulite, não podem ter todas essas coisas que a gente vê/mostra nos blogs: não fiquem tristinhas demais com isso. Uma certa frustração é mais que natural, mas não deixem isso comandar a vida de vocês. Idem pra todas que não são mais adolescentes e que também não podem gastar com luxo. A vida é muito mais que material, nem preciso ir por esse caminho. Mas é importante dizer que de nada adianta entrar numa nóia de ter que possuir tudo que outra pessoa tem, isso só traz dívidas, e, com elas, infelicidade (o contrário do que você tava procurando, certo?). E tem aquilo de ter cuidado com os nossos modelos: a gente não pode separar quem tem porque tem dinheiro sobrando de quem tem porque tá endividado até a morte, certo? E eu super me vejo facinha lá no primeiro grupo, do outro quero distância. ;)
Então, quéris, palavra de quem já fez muita palhaçada desnecessária: vejam todos os blogs, voltem nos que interessarem, pesquisem, perguntem. Mas não pensem na frase "tenho que comprar isso", pensem em pegar o que está sendo mostrado como inspiração pra vida que vocês de fato têm. Vamos ser criativas, criatividade é amor, criatividade é vida! Transformem a sombra Dior numa Vult, e conheçam a fundo o armário que vocês têm - com certeza dá pra fazer muita brincadeira, mesmo que o look não fique idêntico ao da blogueira X.
Longe de fazer a politicamente correta aqui, hein, porque sou daquelas que acham que se dinheiro não traz felicidade então me dê o seu e seja feliz (eu disse, turminha dos cretinos). Óbvio que ninguém opta por ter pouco dinheiro, mas essa é a realidade da maior parte do mundo, e ninguém precisa levar isso pro lado pessoal (a não ser que sua questão seja com o divino). Só acho mesmo que dá pra ser feliz sem precisar comprar tudo que se vê. Eu trocaria todas as minhas maquiagens pro meu cachorro voltar a ter 12 meses, mas não dá, ele continua tendo 12 anos. Isso seria importante poder comprar, sabem, tempo. Claro que eu tô falando de mim, gente, da minha forma de ver as coisas, não quero regular o que é importante pra ninguém. Tudo isso que eu escrevi é importante pra mim - tô falando pra todo mundo, mas a partir do meu ponto de vista, sempre.
Finalizando, viva a vida que você tem, não a que você gostaria de ter. Trabalhar pra ter mais tarde é outra coisa, tô falando do aqui e agora. Fazer dívida por causa de ítens que não são relevantes pra se manter viva não é legal, e não tá na moda. Quem se deixa afetar e não tem dinheiro no final do mês pra pagar o cartão não pode culpar ninguém além de si mesma, hein? Depois do mal feito, não vale xingar lá a blogueira X! ;)
Enfim, me pareceu importante dizer isso, porque, por algum motivo, a gente tem muita adolescente visitando o TT. Bom, aqui vale tudo, vale o que vier, só não vale é me chamar de tia! ;)
* isso era mentalidade dos pais da época, no fim foi uma grande besteira, antes tivessem me deixado mais um ano na outra escola, cuja qualidade de ensino era muito superior.
** sem emissão de juízo de valor, só pra dar a imagem caricaturada da escola mesmo.